Publicado originalmente em 13 de Abril de 2006
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SERVIÇO DE UTILIDADE PÚBLICA THRASH COM H
“I Live, You Die”, Corpse, 1990, BRZ
sons: HEAVEN NEEDS MONEY / SLAVES OF OUR INVENTIONS * / BACK TO MY WORLD / I LIVE, YOU DIE * / TOXIC DEATH * / LIFE REFLECTIONS * / REASON TO KILL
formação: Marcelo Fonseca (vocal & guitar), Marcos Khalil (bass), Luiz Hess (lead guitar), Fabio Russo (drums)
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Hoje é a vez da resenha mais true jamais publicada aqui no Thrash Com H. Sério mesmo.
Simplesmente nunca ouvira falar nesse Corpse, e continuei ñ ouvindo, nem sequer ouvindo lamentos por terem encerrado atividades ou sido banda pioneira, coisas do tipo. Tb ñ li nada (ainda) a respeito duma volta bombástica pra algum show babilônico nalgum palco mesopotâmico para gravação dum DVD ao vivo faraônico a consertar a falha do mundo e dos tempos q ñ os reconheceram quando estavam ativos. Comunidade no Orkut tb ñ tem.[Adendo: tem sim. Quando publicada da 1ª vez, o dono dela “me” encontrou]
Era banda brasileira, isso já dá pra dizer. O selo do vinil, q ganhei da Mônica – uma grande amiga pra quem thrash ou trash faz pouca ou nenhuma diferença – naqueles escritos “fabricado e distribuído por Sonopress” atesta isso. O endereço do selo q lançou o álbum, sediado em Guarulhos, tb. A pesquisa feita no Metal Archives os têm entre 94 outros ‘Corpses‘, ‘alguma coisa Corpse‘ e ‘Corpses alguma coisa‘, e revela q os caras eram sediados em Arujá, cidade da Grande São Paulo. E mesmo assim, continuo sem saber porra nenhuma de quem eram eles, o q fizeram depois, q fim levaram, e tal. Discografia inclui apenas e tão somente este “I Live, You Die” e uma demo anterior. Pouca história pra contar ou encher lingüiça por aqui, afinal.
É o tipo de resenha, como a q fiz do Vodu em janeiro último [reprisada no Exílio Rock em julho último], q periga alguém da banda ou alguma pessoa ligada a eles acabar descobrindo e vir polemizar, discutir, achincalhar, achar legal. Tomara q sim.
De qualquer modo, pouco cabe especular. Vamos aos sons registrados por aqui, e à produção descuidada, toda abafada, q arruína alguma boa-vontade inicial em ouvir o trampo. Sim, pq uma ouvida por cima e/ou desatenta ñ fará justiça às tantas partes e idas e vindas dos sons. Este é o típico caso de disco a ser ouvido várias vezes, e em q sempre se descobre algum detalhe diferente. Pra mal e pra bem.
Pra mal: a praga oitentista das introduções limpas um tanto extensas e anti-climáticas se faz notar. (Até hoje ñ entendo se era tão onda de copiar Metallica. Sendo q na pior das hipóteses soava Flotsam & Jetsam, ou em ñ ficando tão ruim lembraria vagamente Testament). Fora q melhor gravadas q as partes pesadas, o q revela a precariedade na produção tvz tendo ocorrido por defasagem de equipamentos ou por desconhecimento de como se gravar thrash metal. “Heaven Needs Money” ilustra isso: é jurar q se trata de algum som mais pop, pra dali a um minuto e pouco (fossem menos segundos, ficava melhor) mudar bruscamente pras palhetadas abafadas em demasia, dando impressão de serem músicas diferentes, de bandas diferentes.
“Back To My World”, por outro lado – e pra bem – faz bom uso de partes limpas mais pro meio do som (no começo nem tanto: parece balada, e fora Testament nos violões, me lembra algo do Suicidal Tendencies poser), o q tvz denote maior grau de maturidade ao longo das composições. Pq “I Live, You Die” vejo assim um tanto semelhante ao MX em “Simoniacal” [S.U.P. em jan/2005] no sentido de as músicas parecerem dispostas na ordem em q foram compostas. A tendência duma banda, afinal, é aprimorar suas composições à medida em q compõe mais. A exceção é “Reason to Kill”, o pior som do álbum, meio q um amontoado de partes q ñ ficaram bem costuradas. E possui um “uh” celtic frostiano bem evidente ali pro meio. Sendo este um álbum refletivo de época em q gravar algo era mais difícil e árduo, e oportunidades q surgiam faziam com as bandas quisessem aproveitar e registrar o máximo possível de coisas.
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Tivessem durado mais, ou gravado outros álbuns, tvz adquirissem senso de compor músicas com menos partes, de modo a render mais sons. Ñ vejo como demérito isso, uma vez q estamos falando duma banda verdadeiramente de raízes oitentistas, e difícil seria ñ soar como a época “impunha”. Mas, pra destacar algo negativo nesse modus operandis, dá pra dizer q em algumas vezes as mudanças soam abruptas, sem alguma virada ou passagem de transição.
(Vai q tb isso seja um vício deste q vos escreve, devido aos sons noventistas melhor resolvidos nesse quesito a q sou/fui exposto, q me faz estranhar um jeito mais “tradicional” de compor…)
Percebo bastante disso nas bandas oitentistas q ñ vingaram, sobretudo nas brasileiras. Se por um lado denotavam entrosamento – mudanças tantas requerem ensaio e química entre os integrantes – por outro se quebravam alguns sons às vezes desnecessária e abruptamente… “Toxic Death” traz um pouco disso: entrasse ‘no pau’ logo após a intro, ñ daria a impressão de lentidão e de quebra da expectativa de bangear.
“Slaves Of Our Inventions” e “Life Reflections”, por sua vez, trazem um maior senso de cadência, sendo mais baseadas em palhetadas e grooves baterísticos acompanhando-as. E tornam-se relevantes à medida em q mostram ser possível cadenciar o som sem virar aquela coisa funkeada nada a ver, q tanta banda recente acaba cometendo. A 1ª, extensa, contém uma parte de solos bem interessante, com mudanças a ver e trechos q remetem ao Metallica antigo: ñ chega a ser chupim, mas cavalgadas a la “From Whom the Bell Tolls” e “Creeping Death” fazem-se notar.
A faixa-título, por sua vez, assim como “Toxic Death”, são pra empolgar fãs de Nuclear Assault: andamentos baterísticos bate-estaca a la “New Song” cativam. (Ainda q a 2ª tb tenha um tanto de Kreator pré-“Coma Of Souls”). Fora o trampo de backing vocals bem naquela veia clássica. Apenas o vocal, mais rouco e grave, foge ao formato. (E ñ é ruim: o tal Marcelo passa o recado sem encheção de saco de rasgados forçados ou guturais q ñ saberia fazer; a voz do cara é o q está ali, e pronto). E no q se refere à técnica ou a destaques musicais, tem-se (tinha-se) aqui, reiterando, um pessoal bastante entrosado: várias vezes um baixo aparece aqui e acolá (paradinhas como em “Toxic Death”), sendo q jamais mostra-se aquele baixista q fica na cola do bumbo ou dando só notas nas cabeças de tempo; há sons q o cara aparece junto com as guitarras, dedilhando até.
O trampo de guitarras é legal e sem exageros: palhetadas e alternâncias de um fazendo base enquanto o outro sola bem criativas – como na “Slaves Of Our Inventions” citada, mas tb em todos os sons. Ñ há nenhum som por aqui em q o solo dure breves segundos, e as bases – e alternâncias delas durante as alternâncias de solos – mostram gente q respirava e exsudava thrash 24 horas por dia, imagino. Alguns solos com alavancadas tb. O miguxo Wagner ontem mesmo me falava de bandas recentes q se dizem influenciadas por isto, aquilo, aquilo outro, e ñ sei mais o quê SEM MOSTRAREM uma vírgula de referências ou de bom gosto das bandas citadas nos releases: isso ñ se dá/dava com o Corpse.
Q, à semelhança do Vodu (embora sonoramente ñ), usava das referências, influências e artifícios conhecidos ñ pra soar chupim, mas na busca de encontrarem uma cara própria. Tudo q foi citado por aqui de influência assim o é: ñ era uma banda tentando ser o Testament, o Nuclear Assault ou o Kreator brasileiros. Falando francamente: é o caso de banda q mereceria uma reedição do trampo em cd – q imagino inexistir – ou até uma volta, caso voltassem nos mesmos moldes decantados neste “I Live, You Die”.
Q nem é disco divisor de águas do metal brasileiro, tampouco pilar na invenção ou reinvenção de estilo, muito menos uma obra constantemente citada por gente q começou a tocar depois de ouví-lo. Tem pouco mais de meia hora, e tvz incite ainda uma outra reflexão: quantas bandas – boas – por aí ñ ficaram (e ñ ficam, atualmente) à margem, por ñ disporem dum jabá eficiente ou dalguma assessoria de imprensa competente em plantar notas nos sites e revistas? Imagino q tantas outras bandas, como o Corpse, “ficaram pelo caminho”, o q é uma pena. A história do metal brasileiro, afinal, ñ deveria ser só a das bandas q vingaram e das bandas tardiamente reconhecidas.
Um uso adicional e recreativo deste material pode ser feito por babacas true q tenham como profissão de fé intimar ou mostrar a outros (geralmente desavisados ou ‘menos true‘) q conhecem bandas desconhecidas e/ou precárias. Tanta gente com jaco jeans por aí ostentando patches de Artillery, Crossfire (ae, Bruno, aguarde!), Grave Digger, Exumer [S.U.P. em jan/2004]… Q tal copiassem com canetinha – vermelha – o logo dos caras, pra q se alguém perguntar, se pudesse orgulhosamente retrucar: “pô, vc nunca ouviu Corpse?”.