(A pedidos, certo Rodrigo?). E originalmente postada em 21 de Outubro de 2006.
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SERVIÇO DE UTILIDADE PÚBLICA THRASH COM H
“Alcoholic Death Noise”, Cirrhosis, 2002, MNF Brazil/Cogumelo Records
sons: THE SIN – SEXUAL DELIGHT / ALCOHOLIC DEATH NOISE * / AN EYE FOR AN EYE * / NO FUTURE * / WELCOME TO MISERIES / HUMANITY / BEYOND THE SLAVERY OF PAIN / REPULSIVE IMPULSES * / MIDNIGHT QUEEN [Sarcófago]
formação: Fernando (drums), Juarez (bass/vocal), Marcos e Henrique (guitars); keyboards: Tim Garcia e Neto Castanheira
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Taí uma banda q eu gostaria de ver ao vivo, esse Cirrhosis.
O logo dos caras é simpático (duas garrafas nos i´s do nome), a temática idem, a princípio, fora um tanto diferente (falar sobre sexo e goró) e, passada a audição deste “Alcoholic Death Noise”, a boa impressão – q permanece – é a de um trampo legal, bem gravado e produzido, de boas idéias guitarrísticas sobretudo.
Mas, pelo q sei, ñ é banda q apareça tanto por aí. De repente, por falta de grana pra pagar matéria em site e/ou revista. Ou ñ: me recordo de muitas poucas chamadas de shows dos caras (teve até aqui em São Paulo uns meses atrás, no M868, ou estarei delirando?), pra ñ me ater em matérias, q aí ñ me recordo mesmo, em relação a eles. Pq me parece ser banda q ñ se leva tão profissionalmente a sério… no q teria razão sua própria origem.
Q o q sei é haver surgido como projeto paralelo de Wagner Antichrist, do Sarcófago, em momento no qual a banda (melhor chamar de horda? Prefiro nem – até pq vi uns desenhos da She-Ra outro dia, e passei a achar ainda mais ridícula a nominação true ahah) andava parada. Como projeto paralelo desencanado. Q é a impressão por mim cultivada, além disso, pela parca discografia: ainda q surgidos em fim dos 80’s, “Alcoholic Death Noise” é apenas o álbum de estréia do Cirrhosis, muitos anos depois do único outro registro digno de crédito (profissional e comercialmente falando), um split com um certo Lou Cyfer de 1991, lançado pela lendária Cogumelo Records.
E a curiosidade em vê-los ao vivo vem tb da vontade em ver como – e se – conseguem sustentar num palco as várias contradições e fragmentos de q é feito o álbum. Q a meu ver mostra uns caras querendo praticar um death metal old school (e louvações a Entombed, Death, Benediction e Bathory no encarte apenas corroboram a impressão), mas com cacoetes thrash tão disponíveis q fica nítido ser esta mais a praia deles. E ainda momentos com blasts, modernos. Uma banda ousada/arrojada, sem dúvida – ainda mais pros atuais tempos, de formações tão derivativas, compartimentadas ou sem tanta identidade – e mais apreciável q depreciável. A ñ ser, quando nas derradeiras faixas, camas de teclado aparecem, na idéia de dar clima (certamente), sem conseguí-lo. E q, no balanço final, denota um pessoal q careceria de futuros trampos para amadurecer seu som, pro lado de uma identidade única, ou pra escolha em fazerem death OU thrash unicamente. Tocam bem melhor do q gostariam, em suma, e é praticamente impossível querer ser tosco quando ñ se é mais…
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Parte das contradições constantes do álbum é tb a estruturação dos sons, repletos de partes, mas muitos soando abruptos nas mudanças: só q ñ no sentido negativo, como muita banda brasuca oitentista (como o Vodu – reprisado no Exílio Rock em 2010) insistia, de quererem soar fodões, técnicos, coisa e tal. A maioria das passagens, mesmo algumas ñ tão inspiradas (“Welcome to Miseries” tem umas soluções-chavão sabbáthicas em seu início…), desce redondo. Mesmo q a bateria soe demasiado trigada ou até bateria eletrônica: naqueles raros casos em q a perfeição técnica na produção torna o resultado um tanto plástico, artificial. Mas ñ só na rítmica: várias passagens de sons sugerem colagem em computador, coisa e tal.
A outra fragmentação patente por aqui se faz nas letras: apenas “The Sin [uma intro de locução cavernosa, clichê, dum trecho de “Paraíso Perdido”, de John Milton], “Sexual Delight” e a faixa-título fazem jus à pretensão despojada e um tanto chula de falar de goró e muié (ou ainda “sexo rude com mulheres”, vide o trecho “between your legs I will put / my eternal hammer of love” – ui! – nesta 2ª).
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Pois a seqüência dos sons reflete maturidade e maior seriedade em lidar com assuntos outros, q passam a ser problemas do país (“No Future” – “Try to understand a little of Brazil / where present past and future are always wrong”…), lições de moral (“An Eye For An Eye” e “Humanity”) e até mesmo a condenação moralista daquilo mesmo q nas duas primeiras faixas professavam! – como em “Repulsive Impulses”, q conclama alguém viciado em drogas a se levantar ou ver a si mesmo morrer, e em “Beyond the Slavery Of Sin”, q o faz ante a alguém enterrado em drogas e em sexo promíscuo. A mim, algo um tanto contraditório – esquizofrenia pouca é bobagem – mas como sei q NINGUÉM REPARA EM LETRA, perco meu tempo aqui pinçando isso…
E as mesmas letras se fazem daquele jeito algo macarrônico, nitidamente feitas em português e traduzidas posteriormente. Deveriam ter deixado em português: faltam rimas, falta cadência, os sentidos se perderam. Pra piorar, o vocalista ajuda muito pouco – na verdade, nada – com evidente sotaque de quem ñ fala hot dog em inglês. Algo q foi chamativo (um charme? Ui! – parte II, a missão…) no Sepultura oitentista, mas raios ñ caem novamente nos mesmos lugares. Ainda sobre a negatividade vocal, tem se a pouca (nenhuma) preocupação do Juarez em soar inteligível: a maioria dos sons ñ dá pra acompanhar a letra, ñ se entende – a ñ ser com um requintado senso de abstração – onde o cara está, aqui ou ali (faça-se o teste na própria “Sexual Delight”)…
Mas q importa, hein? Aos sons:
“Sexual Delight” entra mais death metal, contendo riffs thrash e paradinhas (sutis) ao longo; suas partes de solo são bem legais (no q é uma tônica no disco todo: parece q nessas horas os guitarristas simplesmente resolveram caprichar), umas partes ao meio, um tanto harmonizadas, tb cativam. Tvz um tanto desnecessário, lá pra 3’20”, o baterista emular o fim da “Angel Of Death” (bumbaiada lombardiana praticamente igual), mas levemos a coisa pro lado do bom gosto… Bom baterista o Fernando, por sinal, embora pudesse ser mais firulento. “Alcoholic Death Noise”, o som, entra chutando tudo com blasts na cara, virando death com paradas/riff thrash, em molde idêntico ao som anterior, mas mais interessante pela variedade contida ao longo dela toda: o contraste da partes mais lentas, onde fica o vocal, com a porradaria predominando em todo o resto achei bem legal. Partes de solos alternam bases lentas e rápidas os sustentando.
“An Eye For An Eye” mostra-se o som mais moderno: death metal cadenciado com levadas truncadas (drags em bumbos e tal); aos 2’20” entra uma rifferama thrash suja, na melhor veia alemã. Eu curto. “No Future”, pra mim o melhor som disparado, quebra tudo entrando com blasts insanos, praticamente grind, pra ninguém duvidar das malévolas intenções (ahah) da banda, e o som é thrash metal puro: levadas baterísticas muito legais e precisas, partes cadenciadas dando o devido contraste. Por outro lado, assim como em “Humanity” (o som de veia Entombed mais nítida), é a q dá mais impressão de bateria eletrônica. Ñ fossem as viradas insanas perpetradas em “Welcome to Miseries”, de início lento (e com guitarra limpa fazendo base), eu o afirmaria. Esses dois, mais “Beyond the Slavery Of Pain”, considero os sons menos legais. Por conta da variedade de partes, legal em todo o álbum, nelas me soarem dispersas.
Dando seqüência aos sons mais lentos – e em horas, arrastado (q é diferente de cadenciado) – iniciada nos 2 sons anteriores, a longa “Beyond the Slavery Of Sin” confirma a tese da dispersão. Fosse ela mais curta, dividida em 2 sons diferentes, ou alijada da cama de teclados boba, dava pra encarar. Ñ q seja um nojo, mas se a proposta era q fosse épica, ficou na promessa – e o final estranho (fica lenta, acaba o último solo, junto com a bateria e termina com uma guitarra limpa meio dedilhada, duma passagem q soa incompleta, pra nada) fica como prova patente disso q me parece. Mesmo valendo, insisto, o destaque pros guitarristas Marcos e Henrique, de muito bom gosto nas partes de solos.
“Repulsive Impulses” vem tb mais lenta, mas resgatando coerência e equilíbrio entre as várias partes propostas (é pra mim, a mais interessante das “faixas lentas”); trechos sustentados por 2 bumbos são interessantes. Quanto a “Midnight Queen”, q só estende a ligação do Cirrhosis com o Sarcófago – fora a produção do álbum creditada ao outro famigerado integrante, o G.M., aqui Geraldo Minelli – ñ posso falar comparativamente, já q desconheço a original, mas algo na timbragem do teclado ñ me agrada. Ñ supera nenhum dos sons próprios anteriores, fechando adequadamente o álbum, q ainda peca por ñ trazer sua letra no encarte, uma vez q é a ÚNICA em q se poderia cantar junto, bradar o refrão.
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“Alcoholic Death Noise”, no frigir dos ovos, achei um bom álbum, q recomendo ñ só a fãs de bandas-Cogumelo (praticamente tornado um sub-estilo metálico), sendo inclusive superior a tantos clássicos pelo selo perpetrados (sobretudo no quesito produção + gravação), mas ainda mais a quem toca, tem crítica e toca em banda de som próprio. Pq tudo o q aqui se registrou, pra bem e pra mal, pode certamente instigar a pessoa a refletir, aqui e acolá, coisas como “poderiam ter feito diferente aqui”, “eu ñ teria posto tal riff tão no meio”, “tal parte poderia ter virado um outro som”, esse tipo de diálogo com a banda, com o som, com o álbum. INTERATIVO, esse Cirrhosis.
E a capa tosca dá pra relevar.