SERVIÇO DE UTILIDADE PÚBLICA THRASH COM H
“I”, Meshuggah, 2004, Fractured Transmitter Record Company
sons: I
formação, ñ especificada: Fredrik Thordendal, Mårten Hagström, Jens Kidman, Tomas Haake
–
Desde q este blog é blog, me cobro por convicções (racionais) ou envolvimento (emocional) suficientes pra lavrar uma resenha. Por mais vã q tenha saído uma ou outra (saíram…), ainda me é um critério, o q responde a limitações por eu ainda ñ ter resenhado certos discos/bandas – decerto os amigos já notaram ausências – com os quais tenho excesso de envolvimento ou carência de entendimento. Para tal.
Por isso, esta resenha ñ se pretende uma resenha, mas um depoimento. Afinal o Meshuggah me assola com uma série de contradições, 1) inerentes à própria obra e 2) causadas em mim por ela. Exemplo-mor: quanto mais ouço a banda, mas sinto q a entendo; porém, duvido q entenda de fato. Ñ pode ser. Demanda esforços racionais e disponibilidade cognitiva tremenda para assimilar, mas ao mesmo tempo me parece q quanto mais exposto fico a seus discos, mais me ressoa eles ñ sendo tão robóticos.
Philip K. Dick, certa vez, lançou a pergunta: “andróides sonham com ovelhas elétricas?”, q os Replicantes parafrasearam – parafraseando a paráfrase, aliás – em “Androides Sonham Com Guitarras Elétricas”. Parece q os nerds math metal do Meshuggah têm sentimento, coração, coerência e senso. Brincam com a gente, vão tirando com a nossa cara. Sonham. Fingem fazer uma coisa, quando de fato cometem outras. Ilusionistas rudes. Vanguardismo, tecnicismo, mas tb… feeling, oras.
Bem… a ñ resenha virou resenha.
***
A quem assustar com o fato de ser este um ep de 1 som apenas, durando 21 minutos, vale lembrar: ouvir 4 ou 5 sons do Iron Maiden numa enfiada consome mais de 20 minutos. Do Metallica idem. Ao mesmo tempo, há sons do Dream Theater com um terço da duração q parecem durar uma semana, sem entregarem mínimas dinâmica e coesão. Tem 21 minutos este “I”? Pq PRECISOU ter 21 minutos.
Pela própria estrutura composicional do som e da banda, elípticos contumazes, no q objeto resenhas desfavoráveis q li sobre, no Metal Archieves, acusando o mesmo de repetição e exaustão. Coisa de quem teve preguiça de ouvir inteiro ou q ñ quis entender a bagaça. O som tem repetições, tem tb variações e tem DINÂMICA: partes lentas, outras sem bateria, partes sem vocal, partes q se integram num todo.
Até mais q o “Catch 33” imediatamente posterior, tb fundado num som dividido em partes. Só q em partes fragmentadas, q se atritam entre si mesmas.
***
Uma grosseira comparação q me dá na telha fazer é a de “I” como um “Thick As A Brick” pós-apocalíptico. Ou uma “Atom Heart Mother” – faixa-título floydica (floydiana?) – com a doença da vaca louca. Progressividade distante, mas tb próxima, de quem – Jethro Tull e Pink Floyd – viajou sem topar seguir regras como as de retorno a tema(s), óbvias passagens repetidas ou condições centrípetas afins. Vc ouve e no fim ñ lembra de como começou, a ñ ser q seja maestro ou fã xiita doentio (no caso dos bretões), ou tudo bem ñ lembrar, com o Meshuggah. É parte da paisagem e da viagem.
O q o Rush e o Soundgarden, noutras proporções, cometem doutros modos. E tb o Meshuggah. Tb aqui. Fazem/fizeram sons complicados, mesmo quando ñ ostensivamente difíceis, e dos quais muitas vezes ñ sacamos as intrincações. Ponto pra eles todos, q nos entortam neurônios, e por isso tb nos ajudaram na gênese de novas sinapses. O Meshuggah, comparando-os a esses citados, considero rock progressivo. Contraditória e igualmente. E do maior gabarito.
Ainda outro espanto q tenho e tive com “I”, adquirido este mês (o preço tb foi lindo), é do mesmo ñ ser álbum novo dos suecos. Parece opus recém-lançado, sem destoar dos álbuns recentes, tampouco de seus antecessores. Evolução e continuidade aliadas. Inclusive na produção, impecável e infalível. Superior ao “The Violent Sleep Of Reason” recente, inclusive. No q me ocorre certo depoimento de Frank Zappa em “Eat That Question” (recomendado outro dia), quando o mesmo revelava pensar sua obra como uma música só, dividida em partes.
Meshuggah me parece tão ORGÂNICO tanto quanto, a ponto de “I” parecer parte duma obra contínua, contígua e maior. E q tvz já tenham até premeditação para encerrar, vai saber. Alienígenas? Voltem à deliberação especulada há 8 parágrafos.
***
A letra de “I”, creditada a Mårten Hagström, possui 42 versos sem repetição ou refrão, q ñ sei cravar se à moda poesia profunda/hermética ou se duma lavra aleatória/dadaísta de razoável vocabulário em inglês. À moda de suas letras em geral, constituída de esboços futuristas, comentários existencialistas e alguma sorte de ñ obviedades. Por vezes juntos, às vezes misturados. Ñ me atrapalha ou cativa, a ñ ser por uma menor participação de Jens Kidman – e sua manha de entoar letras sem métrica com algum método – incômodo e necessário à banda tanto quanto James LaBrie no Dream Theater.
***
No mais: fora “Autobahn” (Kraftwerk), ñ me recordo haver ouvido duas vezes seguidas um som de 20 minutos, sem enfado. E só ñ emendei uma 3ª ouvida – dentre as primeiras vezes – pq já era adiantado da noite e precisei ir dormir. Sem sonhar com ovelhas ou com guitarras elétricas. Subjetivo de dizer, mas é q “I” me instigou a isso. Vontade e fascínio subjugados. Quero crer q rolará com mais gente aqui, tanto quanto outras vezes comigo.
Especulo sobre medirmos músicas em tempo resultando em demérito pras mesmas. “I” é um som, mas tb um álbum, e ñ trechos compilados e colados à força pra impressionar. Ou ganhar tempo. Ou fazer com q o fã perca tempo. O tempo é CONDIÇÃO pra q o assimilemos.
Em tempos (ops!) em q as pessoas ñ têm tido tempo (arre!) pra ouvir álbuns inteiros, “I” ñ é bem um álbum inteiro (embora seja), é uma música. Tb é uma música. Um compêndio de sons, pausas, timbres e ritmos enxertado num acrílico, q ñ o aprisiona nem o resume. E cada um q se vire pra arrumar… tempo pra ouví-lo.
*
*
CATA PIOLHO CCLVIII – “Submission”: Sex Pistols ou Lock Up? // “Shrine”: Triptykon ou Jeff Beck? // “Victory”: PJ Harvey ou Megadeth?