CRYPTA E O LUGAR DE FAL(H)A
Casa de Cultura do Butantã, 25.01.24
Feriado aqui na cidade – 470 anos de São Paulo – e como não aproveitar um show de graça do Crypta?
Assim fui, e o q aconteceu pode ser resumido neste e no próximo parágrafo: uma hora de músicas perfeitamente ensaiadas (mulherada voando) em q tocaram quase todo o “Shades Of Sorrow” pra um público absolutamente receptivo, repleto de periferic@s, meninas e pardos. População rara nos shows.
Ao mesmo tempo, o som estava uma bosta. Começou ruim, melhorou um tiquinho ao longo. A gente ali no público cansou de gritar q estava ruim, pra q melhorassem. Mas não aconteceu: só se ouvia a guitarra da Tayná, os bumbos e a caixa (quando não em levadas blast) da Luana e um pouco do vocal. Quase cochichado. Zero baixo, zero Jéssica, uma lástima.
E era visível q elas se ouviam. Hipóteses deste q vos bloga bosta? Incompetência do técnico de som ou sabotagem, o q a mim ganhou mais vulto quando o guitarrista da Karina Buhr, q não é metal e tocou depois, estava em volume mais alto e com mais peso q Jéssica e Tayná. Pra q isso, kralho?
Independente de tudo isso, minha ênfase por aqui desta vez será em tratar do PÚBLICO, a verdadeira atração, o show pra valer q durou enquanto o Crypta tocava. Antes, um pouco de birra com justificativa:
Fernanda Lira é a dona da lojinha, sabemos. Mas acho o ponto fraco, tecnicamente, e muito fora da casinha. Exemplificando:
- numa hora agradeceu a quem estava presente, disse estar achando foda (ou algo assim) e perguntou quem ali estava vendo o Crypta pela 1ª vez. Uns 80% levantaram a mão, no q ela emendou um discurso – interessante – de ser válido tocar na periferia assim, pra quem não consegue assistir show e emendou o quanto elas – ops – vêm brigando pra isso acontecer cada vez mais. No q os aplausos me soaram mistos, metade aprovando, metade soando como um “aham”
- noutro momento equivocado, disse estar achando o máximo o monte de gente na frente cantando as letras – quê? – e se identificando – sério mesmo? – com as mesmas, sendo q são letras de um ano difícil q ela teve… A mina se acha e acredita de verdade q quem estava ali estava pela identificação com as letras.
Tá certo. Prova adicional contrária: não vi ninguém cantando nada. Não dá pra cantar as letras delas (ênfase: DELAS), mas cantar alguns dos riffs dos sons novos – “Lullaby For the Forsaken” e “Lord Of Ruins” – rolou demais. Menos, dona Fernanda.
Fazer zoinho virado e cara de pomba gira não falta. Assim como o ventilador no rosto. Falta noção e pé no chão – volto a isso no item 8, abaixo.
Falo do público agora. Molecada sub 18. Q me impressionou e emocionou. Antropologia em profusão:
- maioria estava no 1⁰ show do Crypta (pq de graça)
- pessoal nem soube q o som estava ruim
- ninguém senta no chão
- ninguém tirando selfie; pedindo pra alguém tirar foto. Tirei fotos duns 2 grupos, a pedido. Experiência coletiva de música
- meninas adolescentes comprando merchan como quem compra algo raro (e caro – cds a 50 lulas, camisetas a 90). Representatividade
- mocinha exultante de ter conseguido palhetas da Jéssica (puseram num stories da banda no Instagram)
- maquiagens indecisas entre o corpsepaint, o punk e o gótico. Molecada tentando se situar e ser metaleira
- Jéssica Smurfette From Hell descendo do palco pra tirar selfie, dar setlist de presente (tirei foto pra mim), sorrir e dar palhetas às gurias q estavam na grade
- ninguém assediando as garotas
- prancha de bodyboarding: por q ninguém nunca pensou nisso antes
E esse público foi o q fez o show, a mim insuficiente, valer a pena. Pessoal podia estar num culto, num funk na quebrada, indiferente ao rock ou ao metal ou lambendo o Shamangra em rede social, mas estava lá. Ocupando o lugar de fala q não é o meu, nem os lugares de falha da moça do Pix.
Apoiando e coadjuvando uma banda de verdade. Inclusive no comprar merchan. Jéssica (mais ao fim) e Tayná interagiram com o pessoal nalguns momentos (Tayná espantada com o crowdsurfing), Luana dava risadas lá detrás; Fernanda, mais ocupada com outras coisas, tvz tenha olhado o público um pouco. E acho de verdade q muita menina ali saiu do rolê decidida a tocar guitarra e montar uma banda.
Tomara q não demore a acontecer.
Set-list: 1. “The Other Side Of Anger” 2. “Kali” 3. “Poisonous Apathy” 4. “Lift the Blindfold” 5. “The Outsider” 6. “Lullaby For the Forsaken” 7. “Stronghold” 8. “The Limbo” (em backtrack) 9. “Trial Of Traitors” 10. “Under the Black Wings” 11. “Lord Of Ruins” 12. “From the Ashes”
Leo
31 de janeiro de 2024 @ 10:32
Eu acho mesmo que as redes sociais alienam mesmo as pessoas. E me parece que Fernanda está nessa. Mais de 250 mil seguidores no IG, genZ, dona da banda,… Se me perguntar, acho que ela se importa realmente com as pessoas (e na pandemia isso ficava mais evidente), mas tudo que ela faz hoje tem o mesmo grau de verdade e profundidade de ações de responsabilidade social corporativa. Penso que tudo aconteceu muito rápido pra ela, e deve ser difícil processar. Acho que tem muito trabalho de terapia aí. E, pra ela, que é da área de marketing, acho que valeria bater um papo com alguém que faz trabalho com imagem, pq a dela me parece estar bem queimada.
De resto, Luana faz o dela. O negócio é chegar ao extremo técnico, não redes sociais. E Jéssica e Tayná me parecem que não abandonaram o lado “fã”. Talvez por serem músicas contratadas e poderem estar fora a qualquer momento. Apostam no simples.
E, de novo, vou fazer a defesa intransigente de shows públicos. Já falei sobre quanto são importantes. E esse misto de resenha/etnografia sensacional é a prova disso. Nesses lugares, se cria! Cria pessoas, cria linguagens, cria símbolos, cria práticas, cria relações. Quem duvida que logo mais essa prancha apareça em outros shows?
Do caralho!
Leo
31 de janeiro de 2024 @ 14:03
Será que não enviei mesmo meu comentário? Pô! Uma pena. Ele estava extenso – não bom, claro.
Marco Txuca
31 de janeiro de 2024 @ 14:26
Alguns comentários estão falhando, Leo. Estão registrados, mas não visualizam.
Só q o q vc teria feito sobre o Crypta parece q nem registrou. Zero rastro.
André
31 de janeiro de 2024 @ 17:18
Jovem se identifica com jovem. Não tem jeito. É importante que exista bandas que falem pra eles. Aposto que esse foi o show da vida para alguns ali. Por todos os fatores elencos pelo redator. Infelizmente, não duvido que parte dessa turma vire crente, kpoper, sertanejos ou quiçá direitosos bolsonoias daqui uns cinco anos. Já vi esse filme, infelizmente.
Sobre a banda, não tive oportunidade de conferir ao vivo. Mas gostei bem mais desse segundo álbum. Competência técnica não deve faltar ali. Exceto pela Fernanda. Aieh pergunto. Não seria o caso de arrumar uma baixista?
Ainda sobre a Fernanda: entendo que sua presença quebre um pouco a imagem sisuda que uma banda dessa possa passar. Mas duvido que algumas atitudes sejam endossada pelas outras. Posso estar enganado, ,é claro. No fundo, ela é “metal nacional” de coração mkkkkk
Marco Txuca
31 de janeiro de 2024 @ 17:48
Eu acho que deve ajudar no convívio das gurias cada uma morar numa província: Jéssica em Rio Claro (ou Ribeirão Preto?), Tayná em MG, Luana no RS.
Ajuda muito na convivência, q de outra maneira seria tóxica. E seria muito presunçoso de minha parte dizer q a moça do Pix precisa de terapia: acho q precisa de amigos ou melhor amiga pra tomar umas enquadradas.
Outra coisa, q deve ser resultado da fragmentação: sigo Jéssica no Instagram e no Facebook e toda hora vejo ela e Tayná fazendo vídeos juntas, lives, enquetes e vídeos do cruzeiro onde estão tocando. Muito raramente Fernanda está junto.
É pq ela tem um umbigo q não cabe em Tik Tok?
Perfeito, André: ela é metal nacional no DNA.
märZ
31 de janeiro de 2024 @ 20:49
Fica cada vez mais óbvia a diferença de público entre um show da Crypta e um show do Angra. Um representa o novo, uma geração que está descobrindo a porra toda agora, assimilando os arquétipos. O outro representa o velho, o ultrapassado, o que vai ao show pra “sacar o guitarrista”. Esse segundo está – felizmente – em extinção.
Essa renovação é essencial e muito bem vinda, do contrário a coisa toda morre em definitivo.
Marco Txuca
31 de janeiro de 2024 @ 22:01
Frise-se ainda uma coisa, demagogia à parte: o Franga jamais fará show de graça (de graça pra público) em periferia pra molecada.
Pq ninguém ali tem empatia ou anticorpo pra ir ao Jardim Peri Peri.
O máximo q fizeram foi tocar no Sesc Belenzinho lotado ano passado, e aposto q estão no antialérgico até agora.
Leo
1 de fevereiro de 2024 @ 06:38
Tem outras duas coisas que nunca ouvi ninguém mencionar.
A primeira, eu, que, embora tenha nascido aqui, comecei a curtir metal no interior, tenho que defender: Tainá, Jéssica e Luana são do interior. Fernanda é de São Paulo. Pode parecer pouco, mas é MUITO diferente. Quem vem do interior, tem outra relação com banda, com show, com compromisso. Fernanda é paulistana. Inclusive, frequentou muito pós-show aqui. E tem trânsito livre com toda essa galera do Shamangrhangar. Não à toa é da turma que não paga ingresso. E que participa de dvd e etc dos caras.
Outra: elas tem 28, 23 e 27 anos. Fernanda tem 36. É uma diferença importante. Acho que isso não pode ser desconsiderado, por exemplo, quando falamos de uso de internet e redes sociais, de referências musicais, de experiências.
Ou seja, quando dizemos que a atitude dela destoa da do resto da banda e que ela é metal nacional, acho que isso conta muito.
märZ
2 de fevereiro de 2024 @ 08:42
Bem colocado, Leo. Com certeza a idade e origem da Fernanda afetam a atitude em relaçao a tudo.
Leo
2 de fevereiro de 2024 @ 14:01
Pois é, märZ. Acho que especialmente a origem. Como você bem sabe, só quem vive/viveu fora de São Paulo consegue dimensionar a diferença que faz viver aqui pra quem curte metal.
André
2 de fevereiro de 2024 @ 16:52
Dando uma colher de chá para os Shamangras. Só acho que se eles se dispusessem a tocar de graça em locais periféricos, todos lotariam fácil. São grandes ainda. Muito maiores que Crypta e Black Pantera.
Mais: se tocassem mais em cidades do interior que tem um público carente de som. Na minha cidade (Mogi-Guaçu-SP), o último show de rock foi Raimundos em setembro/24.